O MERCADO DA FOLHA

Talvez, como é aposta da tradicional empresa de comunicação, esta é a era da aldeia global, sem política e debate, mas substancialmente do consumo de mercadorias que se avolumam com as notícias.

JORNALISMO - A Folha de S. Paulo finalmente está com nova diagramação que pode ser vista no jornal que circulou no domingo (24), depois, conforme a direção da empresa Folha da Manhã, de um ano de trabalho, com sucessivas reuniões de diretores e jornalistas. No final, o que a família Frias deixa transparecer com o novo formato é um discurso mais voltado para as lógicas globais e afinada com o mercado internacional. Esta seria somente mais uma etapa do meio de comunicação paulista que iniciou esta mudança na década de 80, quando dispensou parte de seu corpo de jornalista que tinha visão à esquerda e moldou uma redação que atendesse aos novos tempos mercadológicos.

Notoriamente, a Folha fez parte do debate sobre as diretas já ocorrido no final da década de 80, que culminou com a abertura política brasileira em 1985, com a eleição de Tancredo Neves, período em que a juventude brasileira entendeu ser o veículo que mais se identificava, diante do teor crítico contra um sistema absolutamente cerceador das lutas democráticas. Entretanto, com o início da abertura e o crescimento dos mercados internacionais que chegavam a países subdesenvolvidos como o Brasil e claramente se mostrava a única alternativa de sociedade, a empresa paulista mudou os seus rumos, de um jornal politizado para a busca incessante pelo discurso liberal globalizante, reproduzido como único pelos Estados Unidos. O reflexo no seu quadro de profissional veio rapidamente com demissão de jornalistas tradicionais e importantes.

Embora, hoje não seja evidente que o princípio de sociedade dos anos 90 seja o ideal, os Frias apostam suas fichas na certeza de um mundo em que a primazia é para o mercado global, e os enunciados que o justifica, sobretudo no campo político e econômico.

Diante de tantas críticas de intelectuais e dos formadores de opinião no passado e na atualidade, a direção prefere apostar na própria consciência em meio a uma geração das novas tecnologias, com inúmeros meios de comunicação que cada vez mais atende públicos específicos. Pressupõe que, estrategicamente, a empresa vai ao encontro do seu segmento das classes A e B, com alto poder aquisitivo, capaz de melhorar a sua performance publicitária em tempos de perda de audiência. Logo, é apenas um projeto econômico e não exatamente jornalístico, afinal, se reconhece que a notícia é o produto a ser vendida como quaisquer bens em um supermercado.

No que se refere à diagramação, o leitor se depara primeiramente com opinião do jornal e logo após com as notícias de mundo - sobressai a aposta na força da globalização, todos assuntos internacionais vêem primeiro. A editoria de política passa a se chamar "poder" e está nas páginas finais, logo após "mercado", a antiga editoria de economia. Em linhas gerais, o seu público inicia absorvendo a opinião do jornal (os editoriais) e seu debate - evidentemente que passa por seleção de assuntos pertinentes com sua linha de pensamento, neste contexto mercadológico, depois por assuntos como cotidiano, ilustrada, saúde. O esporte ganha um suplemente em formato que permite a leitura rapidamente, que pode ser retirado do corpo do jornalão.

A Convergência das mídias é outra aposta da empresa, pois o departamento de jornalismo trabalhará 24 por dia para abastecer as diferentes mídias comercializadas, desde o segmento de telefones celulares que recebem informações até a agência Folha. Assim, o jornalista que produz matéria para a Folha estará com o material publicado em diferentes mídias – difícil saber se isto implica em majoração também dos salários, o que parece pouco provável. Acresce-se assim, o poder de formador de opinião do jornal, que ao mesmo tempo acredita aumentará suas receitas.

No final, o que sobressai em meio a uma sociedade da informação é a busca de estruturar a opinião pública a partir das propostas globalizantes, despolitizada e com olhos voltados integralmente para o mundo das finanças e mercado. Talvez, como é aposta da tradicional empresa de comunicação, esta é a era da aldeia global, sem política e debate, mas substancialmente do consumo de mercadorias que se avolumam com as notícias.

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