MÍDIA, DISCURSO E LIBERALISMO


A revista Veja, encarnando o discurso do liberalismo, teve mais trabalho diante dos caos e da realidade incontestável. Destampou em sua capa uma imagem emblemática.


Nas últimas semanas o mundo econômico tremeu com a avalanche das empresas do mercado financeiras, a começar pelos bancos dos centros econômicos mundiais. O que já era esperado por analista, de fato, ocorreu deixando as bolsas de valores em polvorosa, e não somente isto, os tradicionais meios de comunicação de massa se viram numa situação delicada: como sustentar, apesar das evidências, discurso de um Estado mínimo e instrumento de um mercado livre regulador da sociedade? A tarefa realmente não se mostrou fácil. No final, as capas das revistas e as manchetes dos jornais não deixavam dúvidas, quantas dificuldades teriam para construir um discurso que reduzisse o pessimismo de uma sociedade que poderia despertar – ou já estava desperta - para o problema.

Todo sistema que se preze precisa de reajuste permanentemente, afinal a sociedade é dinâmica, e as mudanças são inevitáveis. Considerando uma condição extrema, a revolução de uma estrutura se faz necessária, afinal, a alternância de um modelo depende de sua eficiência, enquanto resultados na vida prática e sua capacidade de gerar informações que o sustente. Nestas últimas semanas as duas coisas não ocorreram: o símbolo máximo do liberalismo econômico ruiu, e as informações não conseguiam convencer as pessoas, que percebiam, nas imagens globais, o fracasso do governo dos Estados Unidos de conter a quebradeira e a queda acentuada das bolsas de valores.

O mais irônico disso tudo é que os países subdesenvolvidos – na verdade os países periféricos, a margem dos países centrais - não sofreram grandes perdas de capitais e conseguiam se sustentar, sem muitos desgastes. Ou seja, a avalanche não atingia os pobres, que depois de muito sofrer com os espirros do centro resolveram imunizar-se das doenças de um sistema centralizador e dominante. Em outras palavras, lentamente a periferia resolver buscar seus medicamentos e se revigorou contra os vírus que inexoravelmente deveria espalhar a curto ou longo prazo.

Nesta batida, os meios de comunicação de massa globalizados precisavam estampar em suas capas e no seu interior, símbolos (imagem) e texto (discurso) que dessem exemplos de força e capacidade de tomar medidas razoáveis para salvar o sistema.
A rigor, a crise não passou e a pergunta que não se cala é: o liberalismo econômico se mantém ou finalmente sucumbe aos eventos de uma economia sem controle que envolve os interesses de grandes empresas e cifras de trilhões, numa chamada bolha especulativa. Na linguagem econômica créditos apresentados como bons que na verdade não tem liquidez. Em outras palavras são cifras milionárias em créditos não têm valor, o que resulta em pura mágica do mercado financeiro – no final todos os americanos pagarão a conta. Como ninguém quer ficar com prejuízos todos correm se salvar – o que não ocorre com os contribuintes. Um salve-se quer puder de um grupo que sempre foi privilegiado pelo Estado liberal.

A revista Veja, encarnando o discurso do liberalismo teve mais trabalho diante dos caos e da realidade incontestável. Destampou em sua capa uma imagem emblemática. Tio Sam aparece com o dedo apontado para o leitor – neste contexto para milhares de brasileiros – dizendo “Eu Salvei Você!”, como subtítulo: “O governo americano evita o colapso financeiro mundial e nunca mais Wall Street será a mesma”. Talvez devesse dizer: o liberalismo, depois do último colapso deverá sofrer mudanças. De fato, o Estado deverá tomar o seu lugar, ou seja, o regulador da economia sem regras, e, evidentemente, se preocupar com o bem-estar-social, pois a doença que atinge bancos é diferente daquela que deixa enferma milhares de pessoas que vivem na miséria – não somente de alimentos, mas de informação, conhecimento e educação. Contudo, fica uma lição, o mercado muito concentrador certamente não tem condições de se responsabilizar pela vida em sociedade.

Ressalta aos olhos a dificuldades de alguns meios de comunicação de massa ao perceber a realidade não fazem jus a sua função, que é a de informar com isenção. Maquiar informações talvez não seja uma boa saída para uma sociedade que se informa por outros meios. A notícia tem mais rapidez que nos tempos de Gutemberg – o inventor da prensa no século XV -, com os adventos tecnológicos. Apesar do monopólio para o comércio global, a comunicação em rede também abre caminho para fluxo de trocas de informação.

Contudo, vale uma ressalva, a questão da enfermidade ainda não está resolvida, ainda será necessário muito medicamento para tratar a doença. Embora lentamente pode chegar a outros lugares. Afinal, estamos numa aldeia global.

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